“O Caminhante do Tempo”

O Caminhante do Tempo e o Pintor Desconhecido
Se tem uma coisa que aprendi depois de topar com aquele relógio triqui-triqui, é que minha vida nunca mais ia ser que nem antes. Quer dizer, normal já não era, né? Minha cabeça parece uma cuia cheia de ideias, sempre inventando umas aventuras que só existem na minha imaginação. Mas agora? Buueeenooooo, agora era tudo de verdade! Tipo, viro as costas, dou corda no relógio, e BÁ! Tô em outra época. Foi assim que começou meu segundo baita rolê no tempo.
Me acordei e quase morri de susto, de repente um som de pinceladas e um cheiro estranho no ar. Era óleo de linhaça? Sei lá, nunca soube o que era isso. Quando abri os olhos, tchê, me dei conta: tava num ateliê todo bagunçado. Tinha tela pra todo lado, pincel largado, tubos de tinta espalhados no chão… e uma luz tri bonita entrando pelas janelas altas. Um caos artístico, digamos assim. Parecia coisa do início do século XIX. Nem deu tempo de processar quando escutei:
— Báh, mas que droga! — bufou um sujeito desgrenhado, com os cabelos pra cima, mais bagunçado que domingo sem churrasco. Ele largou o pincel no chão como quem larga a cuia depois de tomar chimarrão frio.
Olhei pro relógio. Restavam 23 horas e 47 minutos. Eu sabia que tinha que ajudar aquele cara, mas como? Só sei que fui me chegando no ateliê, desviando de tinta e quase caindo numa pilha de papel amassado.
— Bah, mas que zona! — falei, levantando o pé pra ver a tinta grudada no meu sapato novo. Tava bravo.
No meio daquela zona tava o homem , o dono do grito,encarando uma tela branca com um olhar tão sério que parecia um piá sem sobremesa.
— Tá tudo certo aí, galo velho? — perguntei, porque sou desses, gosto de chegar na manha.
Ele se virou tão rápido que quase chutou um balde de tinta. Me olhou meio desconfiado e foi logo interrogando…
— Quem é tu? — perguntou, franzindo a testa.
— Eu? Ah, sou tipo tua musa inspiradora, né? — larguei essa porque, bah, vai tentar explicar viagem no tempo pra um cara do século XIX.
Ele deu uma risada seca, daquelas de quem tá mais pra baixo que tampa de bueiro e ficou mais quieto que calmaria depois do aguaceiro.
O clima ficou dramático, e eu, com meu instinto de guri metido, já sabia que tinha que resolver.
— Desistindo da pintura? Nem te atreve! Não na minha guarda. — Cruzei os braços, me sentindo o guardião da arte universal.
Ele suspirou e apontou pras telas. Algumas eram até legais, mas tinha uma que parecia um gato voando, ou era um burro com asas? Sei lá. O cara tava em crise.
— Bah, tu só precisa de inspiração! — disse eu, pegando um chapéu velho e jogando na cabeça dele. — Vem comigo, vamo dar um rolê artístico!
Puxei o homem pela cidade. E que cidade, tchê! Século XIX puro: ruas de pedra, carruagens pra cá e pra lá, e um povo vestido tão chique que parecia que ia todo mundo pra um casamento.
Primeira parada: a feira. Mostrei frutas, tecidos, até um papagaio que gritava “Viva o rei!”.
— Olha essas cores, esses movimentos! Tá sentindo a inspiração, ou tá morto?
— Só sinto fome. — largou ele, com uma cara mais murcha que alface esquecido na geladeira.
Respirei fundo. Ok, próximo plano.
Levei ele pro parque. Flores lindas, céu azul, cisnes no lago… uma pintura pronta, né?
— E agora, hein? Tá sentindo? — perguntei, quase implorando.
Ele olhou ao redor, fez um “hmm” e largou:
— Tá bonito, mas não me emociona.
Tchê, aí quase desisti de inspirar o homem. Mas foi então que, virando a esquina, vimos uma cena: uma guriazinha tentando empinar uma pandorga, com o irmão ajudando e o vento dando trabalho. O pintor parou. Ficou olhando, e o olho dele brilhou.
— Isso.
— O quê? A pandorga? O vento? O cabelo? — perguntei, mais perdido que cusco em procissão.
— A emoção. É isso que falta nas minhas pinturas.
Corremos pro ateliê, e ele começou a pintar como se o mundo fosse acabar. Quando terminou, tchê, era uma obra incrível: a pandorga voando, a guria rindo, o céu cheio de energia.
— Tu conseguiu, guri! — gritei, pulando de alegria.
O pintor sorriu, mas aí senti aquela tontura. O relógio me puxando de volta.
— Espera! Quem é tu, de verdade? — ele perguntou, mas eu já tava sumindo.
De volta pro meu quarto, vi o relógio com um novo símbolo: um pincel cruzado com uma estrela. Missão cumprida.
E o pintor? Era o tal Eugène Delacroix, que ia virar um baita nome na arte. Mas, bah, essa história já é outra mateada.
Autor
noisedigitalbr@gmail.com
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